A dona da paisagem
- Antonio Passos de Souza
- 29 de ago.
- 2 min de leitura

No Condomínio Residencial Paraíso das Árvores, sabe-se lá como, em uma área gramada que ladeia os blocos de apartamentos, nasceu um pé de umbu.
Quem conhece sabe que o umbuzeiro é uma moita. À medida que vai crescendo, os galhos começam a se espalhar para os lados e decair, formando uma verdadeira oca no meio.
No início, quando ainda era uma arvorezinha, mas já identificada, o inusitado broto caiu nas graças da maioria dos moradores. Como teria chegado ali?
Uma espécie típica do sertão, pegar e crescer no litoral? Não é coisa comum. Ninguém nunca viu nem soube se o plantio foi obra humana ou fruto do acaso.
Já com altura de encobrir uma pessoa adulta, a extensão lateral da moita de umbu passou a projetar sombra nas paredes e janelas de dois apartamentos térreos.
Os moradores de um desses apartamentos adoraram a cortina natural que se ergueu no jardim. A folhagem passou a retardar a entrada, casa adentro, dos primeiros raios solares do dia.
Dona Florinda, proprietária da outra unidade residencial contemplada com o refrigério matinal, nunca gostou da ideia. Sempre praguejou contra a touceira verde.
O arbusto ficava a cerca de dois metros de distância das paredes externas dos apartamentos. Mesmo assim, dona Florinda vivia se queixando de supostos malefícios.
– Minha casa vive cheia de lagartas que entram por essa árvore! – dizia ela. Perguntados sobre o assunto, os vizinhos negavam qualquer incômodo.
Os anos foram passando e, em atenção a dona Florinda, o umbuzeiro era periodicamente podado. Uma poda sempre mais severa do que a aplicada em outras plantas.
Contudo, a resoluta senhora não largava e nem escondia o desejo de um dia ver o pé de umbu deitado no chão, pronto para o despejo, arrancado pela raiz.
Aproveitando a convocação de uma assembleia, dona Florinda planejou um golpe fatal contra o vegetal. Tramou com ardil a investida, a ser deflagrada no ponto “O que ocorrer”.
Foi uma saraivada de motivos alegados. Porém, houve também muitas ponderações contrárias, apresentadas pelos demais participantes da reunião.
Exasperada, Dona Florinda lançou um último torpedo:
– Eu não gosto de nada na frente da minha janela!
Um estranho silêncio pairou após a frase quase gritada. Foi quando Jorginho, um garoto nascido há poucos anos ali mesmo no condomínio, pronunciou, com voz meiga, umas poucas palavras que pareceram ecoar por todo o quarteirão:
– Oxente, dona Florinda! Além de ser dona do seu apartamento e da sua janela, a senhora também quer ser dona da paisagem, é?
Foto: Redes Sociais / Reprodução.
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