O colecionador de sinos
- Izabel Melo
- 13 de nov.
- 3 min de leitura

Quando Januário nasceu, o sino da Matriz da sua terra natal anunciava a hora do Ângelus, aquele seria o primeiro som registrado pelos seus ouvidos. Anos depois, aos quatro anos, foi levado embora para morar com parentes, pois, sua mãe, já separada do seu pai e passando dificuldades, não podia sustentá-lo. Na estação, o sino tocava insistentemente anunciando a saída do trem, desesperado e em prantos, agarrava-se à saia de sua mãe, aquilo seria uma difícil separação, necessária, mas, para ele, bastante dolorida. Essa é a história que ele nos contou para explicar os motivos que o levaram a se tornar um colecionador de sinos.
Na entrada de sua casa, ao lado de um pequeno portão, existe um belíssimo sino com detalhes em dourado servindo para anunciar a chegada de visitantes. Quando vou até lá não consigo tocar apenas uma vez, apesar de saber que foi o suficiente para me fazer anunciar, mas o som é tão lindo que me arrisco a tocar diversas vezes. Acho que ele já está acostumado, pois, não parece se aborrecer, e me recebe com largo sorriso.
Dentro, a casa mais parece um santuário de sinos, se é que se pode chamar assim. São tantos dos mais variados tamanhos e formatos, alguns enfeitados com arabescos outros com incrustações em pedras, uns tão pequeninos que mais parecem enfeites de árvore de Natal.
Quase sempre é ele quem principia a conversa, e, como não poderia ser diferente, o assunto recai na sua coleção de sinos:
– Quando estou triste, toco o sino da alegria, devo tocá-lo suavemente para não quebrar, pois é feito de um cristal puríssimo e delicado. O sino da esperança é de um material mais resistente, aguenta vibrações mais fortes, já o da fraternidade é maciço e costumo fazê-lo soar todos os dias. E assim ele vai discorrendo sobre cada um, do que são feitos, o que representam. Um sino em particular me chama a atenção, parece ser de bronze, tem nele algumas letras do alfabeto grego, pergunto:
– E este? Tem algum significado?
Ele o segura emocionado e diz:
– Era da escola que estudei, tocava para avisar a hora do recreio. Quando eu o escutava ficava aflito, não conseguia participar das brincadeiras, porque os outros meninos maiores batiam em mim. Quando soube que a escola seria demolida, fui até lá para comprá-lo, não quiseram vender e me deram de presente. Agora, ele faz ressoar o perdão. Falou comovido.
Acho que a coleção de Januário reverberou em outros ouvidos, porque há vários dias, começou a chegar à sua casa um bom número de visitantes para escutar os seus sinos, principalmente os da amizade e solidariedade. Quem sabe, talvez, passem a imitá-lo, e se tornem iguais a ele, colecionador de sinos.
Foto: Articulistas em rede – Museu de Arte Sacra de São Cristóvão/SE, 2025.
Izabel Melo nasceu em Maceió/AL e reside atualmente em Aracaju/SE. É autora dos livros Histórias de Minervina, Edição da Autora, 2016; Nove mulheres e suas histórias, Editora ArtNer, 2021 (Com incentivo da Lei Aldir Blanc); A lenda do caju, Editora ArtNer, 2021 (Com incentivo da Lei Aldir Blanc) e Os 5 sentidos da Natureza, Edição da Autora, 2023.
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