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Guerra e literatura: pra não dizer que não falei das flores

Atualizado: 29 de abr.

Trump e a guerra comercial

Vivemos tempos terríveis, talvez como vivia-se na primeira metade do século que passou até a celebração da paz em 1945. Vivemos na incerteza se uma terceira guerra nos ameaça. Há nesse momento guerras estúpidas, como todas, e o megalômano do Donald Trump declara uma por enquanto comercial que traz tensão ao mundo por conta de tarifas, não se sabendo as consequências.


A guerra, mais que uma atitude política, é um campo para matar uma maioria inocente sob o pretexto de "defender sua pátria". Um dos mais impactantes romances que já li, "Nada de Novo no Front" do alemão Erick Maria Remarque, narra um episódio em que o protagonista se depara sozinho com um soldado inimigo e trava com ele uma luta aberta até tê-lo atingido.  A luta se dá em uma cratera e Remarque (na verdade o personagem Paul Baumer que era uma espécie de alter ego) estando seu inimigo ferido e agonizando, matou-o à baioneta para fazê-lo silenciar (o seu contendor gemia de dor e podia alertar os compatriotas) para poder atravessar a noite sem ser descoberto.


O relato de Erick Remarque é magnanimamente comovente.  Indaga quem teria sido aquela sua vítima. Vai aos bolsos do morto e descobre que ele trazia uma foto da mulher e filho com uma carta da esposa esperando vê-lo retornar sadio. O personagem Paul Baumer chora e vela noite à dentro aquele que ele mesmo matou e promete a si mesmo que depois da guerra iria buscar a família para entregar aqueles simbólicos pertences. Quando o dia amanheceu parte, sem antes deixar de fazer uma oração pelo que ele tirara a vida e por quem não nutria nenhum ódio: "ou era ele ou eu", disse, "estávamos na mesma condição."


Em outra considerável obra – das maiores da cultura universal, a "Ilíada" narra a Guerra de Tróia, uma guerra com o motivo fútil para resgatar Helena, esposa do rei de Menelau, de Esparta. Helena apaixonou-se por Páris, o príncipe filho do rei de Tróia Príamo, e com ele foge. Numa das mais marcantes passagens do grande poema do bardo Homero, o aparentemente imbatível Aquiles matou o herói dos troianos Heitor, irmão de Páris e leva seu corpo dilacerado, jogado na frente de sua tenda para ser devorado pelos abutres.


O pai de Heitor, Príamo, o velho rei dos troianos, sob o manto da noite vai até a tenda de Aquiles e beijando-lhe a mão implora pelo corpo do filho dizendo: “Aquiles, Aquiles... tenha piedade de mim. Lembra-te do teu pai. Compadece deste que acaba de beijar a mão que tirou a vida do próprio filho. Dá-me o corpo de Heitor para que eu possa dar a ele um enterro digno de sua grandeza".


Aquiles comove-se e abraça o velho e alquebrado rei, entrega o corpo de Heitor estraçalhado não sem antes mandar limpar e untar.  Ambos choram. É o final do poema épico. Teria Homero o propósito de dizer aos do seu tempo e dos tempos futuros que na guerra não há vencidas nem vencedores? Para que afinal guerreamos?  A humanidade que é capaz de tantas façanhas tecnológicas, inclusive as sofisticadas armas de destruição, é incapaz de compreender a si própria e o sentido da existência.


Eu mantenho-me pacifista com a flor da escrita, como na utopia do beija-flor que queria acabar o incêndio na floresta com gotículas que recolhia no mar. Sei que não vou ver o mundo que imaginei possível. Quimeras e utopias são muitas vezes realidades que ainda não se fizeram possíveis, mas trazem a esperança. Por isso acredito em utopias. Enquanto a discussão avança, volto à leitura de um dos meus autores prediletos, o norte-americano Ernest Hemingway: o "Adeus às armas". Emblemático para esse momento. Talvez.


Fotos: Redes Sociais / Reprodução / Arte: Articulistas em rede.

Luiz Eduardo Oliva --- advogado, membro da ASLG, do IHGS e da ARLAC.


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